“QUEM É VOCÊ?”
Adriana não conseguia reconhecer de onde vinha a voz. Se dos arredores, ou se de dentro da própria cabeça. Afinal, tinha ouvido muito das duas desde que chegara ali, onde seus pais, por amor mal direcionado, a haviam posto. Um hospital psiquiátrico.
Por meses ela vivera naquela cela acolchoada. Com visitas diárias de enfermeiras e médicos que diziam palavras simples em vozes calmas. Mas quando eles saíam, outras vozes surgiam. Ameaças horrendas em gritos histéricos. Arfares, gemidos e urros povoavam cada uma das noites da adolescente. E toda manhã, o Dr. Marques vinha, com seus olhos cinzentos sorrindo, e dizia a ela que era tudo um sonho ruim, que ela podia passar por aquilo sem...
“QUEM É VOCÊ?”
A voz fazia algo que nenhum outro som fazia na cela acolchoada: ecoava. Explodia como um trovão próximo e ecoava, até ser apenas um sussurro. Vez após outra, após outra, após outra... E então as lembranças voltavam. Uma infância sem nada demais em uma família de classe alta. O primeiro sexo escondido em um quartinho em uma festa do colégio, odor de álcool e borracha tirando qualquer romantismo. Rodízios de pizza, doces de ameixa...
“QUEM É VOCÊ?”
“Pára de gritar comigo!!”. A resposta de Adriana não ecoou, mesmo sendo um grito dado com todas as forças. Ela se lembrava de quando começou a ouvir coisas, a sentir coisas que não tinham por que ao redor. A ver emoções, e sentir cheiro de cores; a ouvir murmúrios na sala de aula. A lembrar de lugares onde não esteve, a...
“QUEM É VOCÊ?”
“Adriana!!!! Me deixa em paz!!!”
“ADRIANA É UM NOME, NÃO UMA RESPOSTA.”
A jovem ficou calada. Desde que começara a fazer perguntas, a voz sem gênero não tinha dito mais nada.
“QUEM É VOCÊ?”
“Eu... eu...”
“EU É UMA ILUSÃO, NÃO UMA RESPOSTA.”
Adriana sentia a cabeça doer, confusa. Se lembrava de outras coisas, outras estrelas no céu diferentes das que via na noite iluminada da cidade. Luzes que...
“QUEM É VOCÊ?”
“Não sei!! Me deixa em paz, tá bem? Não sei, não sei.”
“ESSA É A RESPOSTA. GOSTARIA DE SABER?”
Adriana arregala os olhos, dúvidas atrás dela. As lágrimas que correm pelo seu rosto respondem que sim, que ela tem agora a certeza de não estar louca, de querer saber a verdade, afinal.
“ENTÃO SAIA DAÍ. VENHA ATÉ MIM. CONHEÇA QUEM VOCÊ FOI EM OUTRO LUGAR, EM OUTRO TEMPO”
Naquela manhã, o Dr. Marques acordou com um alarme. Adriana não estava em seu quarto. A enfermeira só encontrara a camisa de força largada no chão com as roupas da menina. Mesmo enquanto ativava a segurança, Marques sabia que nada iriam encontrar. Vestimentas não eram necessárias no lugar para onde ela tinha ido. Mas ele iria atrás dela. Afinal de contas, o Plano Mental era domínio de seus mestres, os Centriarcas. Não importa quem fosse o responsável pela liberdade da menina; iria pagar o tempo que ele desperdiçara ao redoutriná-la. Maldição. O tratamento estava indo tão bem... não era sempre que um Mestre das Escolas Iniciáticas era pego em uma encarnação mais fraca, antes de se lembrar de si mesmo.
Mas existem outros pacientes para cuidar agora... e nem todos salvariam a si mesmos do peso que Maya possui...
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