Já há muitos dias a tempestade se tornava cada vez mais causticante; o ar estava pesado, saturado de fluidos pestilenciais que dificultava a respiração. O zimbório celeste era de um negrume horripilante. A noite castigava, raios voejavam em todas as direções se chocando com os edifícios. Qual não foi o espanto quando o relógio já marcava próximo do meio-dia e a luz do sol não dava mostras de sua presença beatífica.
Pessoas andavam por todos os lados não entendendo o que estava ocorrendo. Apesar de amanhecer apenas no relógio a escuridão ainda era total. Não se ouvia o gorjear dos pássaros, somente a turba de transeuntes que ocupavam as ruas em discussões estéreis sobre o que estava acontecendo. Já no final do dia a tempestade diminuía consideravelmente, o tempo oferecia uma tranqüilidade momentânea.
Enquanto isso, do outro lado da cidade alguém caminhava por um beco escuro, poças de água eram espirradas a cada passo, e por onde passava a escuridão era ainda maior. Ratos deslizavam pelos cantos do beco passando por cima de mendigos que se protegiam do frio e da chuva que já cessara.
Um mendigo que acabava de acordar deu uma pequena espiada sobre seus trapos imundos. O que ele vê deixou-o estarrecido, todos os seus pelos se eriçaram, fazendo com que seu coração parasse de bater, deixando o corpo inerte. A visão congelada em sua íris era de um ser envolto em nuvem negra a ponto de não ser possível ver nada além de seus pés.
No subúrbio um grupo de homens guardavam alguns símbolos místicos e saiam encapuzados por corredores secretos para a via pública, deixando naquele ambiente um corpo mutilado por algum ritual maléfico.
Horas mais tarde em uma galeria nos subsolos, o mesmo grupo, se reunia a espera de alguém. A impaciência era visível pelo tempo que estavam ali. Era possível observar as tochas tremulando e as sombras dos presentes dando um ar mais terrível. De forma irresistível, todos lançaram-se ao chão, gritando de forma lacinante, como que sentindo uma dor imensurável. Rolavam e debatiam-se estrepitosamente.
Apenas o que parecia ser o chefe permanecia de pé sem nenhum sintoma aparente. Olhando para a porta, onde estava parado a estranha figura, disse:
- Pare com isso, não foi por isso que eu te trouxe.
Nada se podia ver dela, a não ser uma escuridão que o envolvia.
- Você terá que me obedecer. Disse o chefe tentando parecer firme.
A figura de escuridão, abriu a boca e dela saíram sons guturais, como que de trovões, gritos lancinantes de dor ou coisa pior. Porém, uma frase foi inteligível, como expressando sua intenção.
- Você me trouxe, mas eu tenho meus próprios propósitos, e um deles é o seu fim.
INVOCAÇÃO foi escrito por Marcel Herrero