Uma elegante moça de pele morena e dreadlocks volumosos andava pela parte mais sombria da cidade sem ser notada. Dhishani – era assim como se chamava - aproximava-se lentamente da parte mais escura de um beco, envolta numa densa neblina quase sobrenatural.
Nunca teve medo de nada e não teria agora. Seriam os chamados que recebera sérios ou mera brincadeira? Enquanto seus sentidos aguçados vasculhavam na escuridão, uma pesada mão se apoiou em seu ombro. Ela só iria se dar conta disso muito tempo depois, mas na hora não estranhou que alguém pudesse ter chegado de forma tão imperceptível . Dhishani se virou apontando sua faca afiada para a garganta do sujeito. O estranho era alto, seus ombros largos e o cabelo comprido. Uma barba vermelha com alguns fios amarelados cobria parte de seu peito. Seus olhos eram negros, e uma cicatriz cobria sua cara, da orelha esquerda até o canto do lábio.
Sem demonstrar a menor alteração, o homem começou a falar com uma voz baixa e rouca.
— Como pode uma Primal se vestir deste jeito? Será o que o futuro irá nos transformar em Guerrilheiros?
O tom calmo da voz só serviu para irritar ainda mais Dhishani. Com sua faca a ponto de matar o estranho, respondeu imediatamente num tom furioso.
– Quem é você para falar assim comigo? Eu me visto do jeito que bem entender...
O sujeito soltou uma gargalhada estridente que lembrava vagamente o grito de uma ave de rapina.
— Quem sou eu? Os Primais já se esqueceram dos antigos da Gênese?
A revelação quase fez Dhishani perder o controle, que tentou não hesitar. Tentou gritar algo, mas antes que alguma palavra mais fosse pronunciada, o homem desvencilhou-se e segurou Dhishani pelos pulsos, num aperto insuportavelmente forte.
– Sou Henokh, da Gênese, o Açor que paira sobre as planícies. Minhas palavras têm autoridade, menina !
Dhishani encarou profundamente o olhar de Henokh. O estranho ruivo não deixou que ela abrisse a boca.
– A Gênese é responsável pela força dos Primais ! Não me agrada vê-la vestida como se fosse uma garota de butique !
Ao dizer isso ele arrancou o piercing do umbigo de Dhishani . Dhishani não demonstrou nenhuma dor. Ameaçou um sorriso irônico, e seus dentes agora eram como presas, e suas unhas como garras aduncas.
Soltou um uivo furioso e golpeou Henokh com os punhos cerrados no nariz. Henokh foi atirado com violência de encontro ao muro. Dhishani gritou alguns palavrões e acertou um chute no queixo de Henokh.
– Ninguém fala assim com a líder do Bando Marfim! Todos os meus inimigos estão mortos, e não de morte natural! Nenhum inglês vai me ditar regras!
Henokh solta uma gargalhada, limpando o sangue que escorre dos dentes. Sua gargalhada irrita ainda mais a Primal, que num só movimento agarra uma lata de lixo, arremessando-a em seu desafiante. A lata se choca contra o muro num estrondo metálico desagradável. O outro Primal havia sumido.
Um violento golpe nas costas faz Dhishani cair, imobilizada. Henokh aproxima-se suavemente de seu ouvido e fala devagar — Eu nasci na África, menina. Antes de você nascer eu já havia mandado muitos nahash de volta ao Sheol.
Dhishani faz força, mas não consegue mover um músculo. Concentra-se então e sua mente torna-se um mosaico de sensações e em seus olhos brilham pupilas felinas douradas. Solta um miado agudo que é respondido nas sombras do beco. Henokh pára de rir, percebendo o que iria acontecer...
Lentamente, eles foram surgindo das profundezas do beco, as passadas silenciosas e elegantes. Em pouco tempo, uma multidão de gatos lotava o beco estreito. Uma avalanche carnívora de felinos frenéticos passa por cima de Dhishani e engolfa o seu oponente, com dezenas de pequenas garras e dentes afiados cortando, mordendo e retalhando. Henokh agitava os braços tentando se libertar, mas para cada animal que caía, dois novos surgiam.
Dhishani se levanta e observa de longe as dificuldades de Henokh.
— Que isto sirva de lição para você...
Um grito estridente faz os tímpanos de Dhishani quase estourarem de dor. Os corpos dos gatos desmaiados se amontoam ao redor de Henokh, e os poucos que restam afastam-se confusos. O primal volta a sorrir, e se dirige a Dhishani num inesperado tom amistoso .
— Foi uma boa lição... Eu gostei de você, garota . Você tem fibra. Estou feliz com o que vi, mas lembre-se de uma coisa...
Dhishani sente um súbito mal-estar, quando um silêncio sobrenatural envolve o beco durante um instante. Os ferimentos de Henokh começam a cicatrizar. Seus olhos começam a brilhar. A pele se empalidece, os cabelos começam a crescer. Os músculos se retesam e incham. Os poucos gatos restantes agora somem numa disparada medrosa. O corpo de Henokh cresce e vai assumindo uma forma leonina, de cor prateada, com um brilho quase metálico.
Dhishani que não pode ser considerada uma mulher baixa, mal atinge a altura do tórax do monstro. Henokh ergue o corpo da moça como se fosse um boneco. Aproximando-a de seu rosto, Henokh murmura laconicamente :
— Não subestime A Gênese...
Dhishani é largada no chão. Os músculos poderosos impulsionam o corpo monstruoso num salto que transpõe o muro, desaparecendo na escuridão. A primal inspeciona seus ferimentos, a partir deste dia se lembrará com respeito de seu adversário. Ela foi a primeira a ter um vislumbre do futuro, quando todos os Primais, antigos e novos, voltarão a andar juntos.
Nunca teve medo de nada e não teria agora. Seriam os chamados que recebera sérios ou mera brincadeira? Enquanto seus sentidos aguçados vasculhavam na escuridão, uma pesada mão se apoiou em seu ombro. Ela só iria se dar conta disso muito tempo depois, mas na hora não estranhou que alguém pudesse ter chegado de forma tão imperceptível . Dhishani se virou apontando sua faca afiada para a garganta do sujeito. O estranho era alto, seus ombros largos e o cabelo comprido. Uma barba vermelha com alguns fios amarelados cobria parte de seu peito. Seus olhos eram negros, e uma cicatriz cobria sua cara, da orelha esquerda até o canto do lábio.
Sem demonstrar a menor alteração, o homem começou a falar com uma voz baixa e rouca.
— Como pode uma Primal se vestir deste jeito? Será o que o futuro irá nos transformar em Guerrilheiros?
O tom calmo da voz só serviu para irritar ainda mais Dhishani. Com sua faca a ponto de matar o estranho, respondeu imediatamente num tom furioso.
– Quem é você para falar assim comigo? Eu me visto do jeito que bem entender...
O sujeito soltou uma gargalhada estridente que lembrava vagamente o grito de uma ave de rapina.
— Quem sou eu? Os Primais já se esqueceram dos antigos da Gênese?
A revelação quase fez Dhishani perder o controle, que tentou não hesitar. Tentou gritar algo, mas antes que alguma palavra mais fosse pronunciada, o homem desvencilhou-se e segurou Dhishani pelos pulsos, num aperto insuportavelmente forte.
– Sou Henokh, da Gênese, o Açor que paira sobre as planícies. Minhas palavras têm autoridade, menina !
Dhishani encarou profundamente o olhar de Henokh. O estranho ruivo não deixou que ela abrisse a boca.
– A Gênese é responsável pela força dos Primais ! Não me agrada vê-la vestida como se fosse uma garota de butique !
Ao dizer isso ele arrancou o piercing do umbigo de Dhishani . Dhishani não demonstrou nenhuma dor. Ameaçou um sorriso irônico, e seus dentes agora eram como presas, e suas unhas como garras aduncas.
Soltou um uivo furioso e golpeou Henokh com os punhos cerrados no nariz. Henokh foi atirado com violência de encontro ao muro. Dhishani gritou alguns palavrões e acertou um chute no queixo de Henokh.
– Ninguém fala assim com a líder do Bando Marfim! Todos os meus inimigos estão mortos, e não de morte natural! Nenhum inglês vai me ditar regras!
Henokh solta uma gargalhada, limpando o sangue que escorre dos dentes. Sua gargalhada irrita ainda mais a Primal, que num só movimento agarra uma lata de lixo, arremessando-a em seu desafiante. A lata se choca contra o muro num estrondo metálico desagradável. O outro Primal havia sumido.
Um violento golpe nas costas faz Dhishani cair, imobilizada. Henokh aproxima-se suavemente de seu ouvido e fala devagar — Eu nasci na África, menina. Antes de você nascer eu já havia mandado muitos nahash de volta ao Sheol.
Dhishani faz força, mas não consegue mover um músculo. Concentra-se então e sua mente torna-se um mosaico de sensações e em seus olhos brilham pupilas felinas douradas. Solta um miado agudo que é respondido nas sombras do beco. Henokh pára de rir, percebendo o que iria acontecer...
Lentamente, eles foram surgindo das profundezas do beco, as passadas silenciosas e elegantes. Em pouco tempo, uma multidão de gatos lotava o beco estreito. Uma avalanche carnívora de felinos frenéticos passa por cima de Dhishani e engolfa o seu oponente, com dezenas de pequenas garras e dentes afiados cortando, mordendo e retalhando. Henokh agitava os braços tentando se libertar, mas para cada animal que caía, dois novos surgiam.
Dhishani se levanta e observa de longe as dificuldades de Henokh.
— Que isto sirva de lição para você...
Um grito estridente faz os tímpanos de Dhishani quase estourarem de dor. Os corpos dos gatos desmaiados se amontoam ao redor de Henokh, e os poucos que restam afastam-se confusos. O primal volta a sorrir, e se dirige a Dhishani num inesperado tom amistoso .
— Foi uma boa lição... Eu gostei de você, garota . Você tem fibra. Estou feliz com o que vi, mas lembre-se de uma coisa...
Dhishani sente um súbito mal-estar, quando um silêncio sobrenatural envolve o beco durante um instante. Os ferimentos de Henokh começam a cicatrizar. Seus olhos começam a brilhar. A pele se empalidece, os cabelos começam a crescer. Os músculos se retesam e incham. Os poucos gatos restantes agora somem numa disparada medrosa. O corpo de Henokh cresce e vai assumindo uma forma leonina, de cor prateada, com um brilho quase metálico.
Dhishani que não pode ser considerada uma mulher baixa, mal atinge a altura do tórax do monstro. Henokh ergue o corpo da moça como se fosse um boneco. Aproximando-a de seu rosto, Henokh murmura laconicamente :
— Não subestime A Gênese...
Dhishani é largada no chão. Os músculos poderosos impulsionam o corpo monstruoso num salto que transpõe o muro, desaparecendo na escuridão. A primal inspeciona seus ferimentos, a partir deste dia se lembrará com respeito de seu adversário. Ela foi a primeira a ter um vislumbre do futuro, quando todos os Primais, antigos e novos, voltarão a andar juntos.
DUELO DE GERAÇÕES foi escrito por Simões Lopes.