domingo, 9 de dezembro de 2007

Rebelião 7: Conversa entre Cavaleiros


O assassino estava posicionado e tudo estava pronto. O cobertor estava estendido na laje, protegendo seu corpo deitado do calor que emanava do prédio. O rifle pronto e em posição. Binóculos à mão. E, finalmente, uma garrafa térmica com um suco de laranja bem gelado ao seu lado. O cliente era um artista plástico, que costumava fazer uma corrida no parque abaixo todas as manhãs. Um lugar perfeito para a emboscada, em especial o ponto de contato escolhido, que dificulta a percepção da direção de onde viria o disparo. Isto facilita a fuga e complica a investigação.

O cliente chegou cerca de 10 minutos após o assassino se posicionar. Sozinho, aquecia o corpo para a corrida com pequenos pulinhos e alguns alongamentos. O assassino se permitiu um breve momento de satisfação. O cliente não tinha seguranças que o acompanhavam e não mudava sua rotina. Chegava a ser tão fácil que quase não valia os honorários.

Mas então, ele retornou à sua concentração. O cliente começara sua corrida. Em cerca de 70 a 80 segundos, ele estaria no ponto de contato. O parque estava bastante vazio neste ponto, o corpo do cliente poderia levar até 10 minutos para ser encontrado. Era um tiro fácil.

O pequeno sibilo do projétil sendo cuspido pelo rifle, foi imediatamente acompanhado da visão de sangue espichando por trás da cabeça do cliente e de sua queda para trás. Só o violento movimento da cabeça ao receber o tiro, já poderia ter partido seu pescoço. O projétil vazou seu olho direito e saiu um pouco acima da nuca. Tudo continuou normal no parque. Ninguém percebeu o que aconteceu.

O assassino arrumou tudo rapidamente e saiu do local. Parou em um café e relaxou. Foi para casa e avisou via e-mail ao contratante que o serviço estava feito. Tomou um bom banho e descansou.
Ao acordar, a primeira coisa que pensou foi em ver uma televisão. Hoje, ele poderia assistir ao seriado que gostava tanto. Antes, uma verificação da caixa de mensagens e a confirmação do valor depositado em sua conta, pelo serviço da manhã. Mas as coisas não aconteceram como ele esperava.

O cliente - vivo e ileso - estava em sua sala de estar.
Mantinha um sorriso de Mona Lisa em seu rosto. Apesar da aparente demonstração de tranquilidade, o assassino percebeu com seu treinamento que ele estava perfeitamente posicionado para o combate. O choque de perceber que ele estava vivo e bem quase fez com que passasse despercebido a katana que este trazia na mão.

- Como me achou aqui? (o assassino fez um certo esforço para manter a voz impassível)

- Tenho meus meios e meus contatos... (sua voz era fria e impessoal, nem lembrava o estereótipo de um artista plástico sensível)

- Você deveria estar morto... (ele não acreditava que estava falando daquela maneira. Mas, ainda assim conseguiu manter a voz fria a impessoal).

- É verdade... um excelente tiro... (o sorriso do cliente o deixou um pouco desconcertado, parecia algo demoníaco e divino ao mesmo tempo).

- Esta é a minha arte...

- Arte... (pensativo) Sim, imagino que seja e gosto disso... (mas, de repente, seu olhar ficou duro como pedra) Quem contratou você?

- Não posso dizer... seria anti-ético... feriria minha honra profissional. (o assassino procura com suas mãos uma arma que ele mantinha à mão atrás do sofá de que ele se encontrava próximo)

- Honra... (seus olhos se estreitam, divertidos) Gosto cada vez mais de você...

O movimento seguinte foi rápido. O assassino sabia que o cliente nunca poderia atingi-lo antes que ele disparasse sua arma. Mas não foi isso que aconteceu.

Tudo o que o assassino percebeu foi que ele ouviu o estampido do disparo, mas o tiro acertou um quadro que ele gostava muito à sua esquerda e mais acima. Ele se perguntou como poderia ter errado tanto o alvo á sua frente quando começou a sentir um estranho calor em seu punho. Parecia que algo molhava o seu braço. Foi então que ele percebeu que o cliente se encontrava bem na sua frente numa pose de guerreiro, com as pernas arqueadas e suas mãos segurando a katana que apontava para o teto, encostada à altura do ombro de seu adversário.

"Rápido demais, rápido demais". Foi o que ele pensou enquanto tentava levantar a arma e apontar para o cliente. Então ele percebeu. Não havia arma. Não havia mão. O que molhava seu braço era seu próprio sangue que esguichava de seu punho. Ossos, músculos, nervos e artérias expostas com um único movimento. A mão ainda segurava a arma no chão.

A percepção do que aconteceu veio acompanhada da dor que viria acompanhada de um grito, se este não fosse abruptamente interrompido pela espada oriental, que atravessou com uma força impressionante a sua garganta e cravou na parede atrás dele.

CONVERSA ENTRE CAVALEIROS foi escrito por Danilo Faria

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