quinta-feira, 22 de novembro de 2007

Rebelião 1: Mestres e Aprendizes



O jovem aprendiz andava muito nervoso nas últimas semanas. Tantas descobertas o deixavam confuso. Ao ver seu velho mestre passeando pelo jardim, venceu com relutância a timidez habitual e aproximou-se do Mestre. Como se adivinhasse, o mestre lhe falou com largo sorriso nos lábios.
—Você parece transtornado, Isaiah.
— São muitas dúvidas, mestre... quantas coisas mais eu terei que decorar na primeira semana ?
— Você está aqui para saber e não decorar...
— Bem... quer dizer... é sobre a distinção de Asiah e Briah ? E o conceito...
O mestre o interrompe, gargalhando.
— Ora, jovem ! Vamos com calma ! Eu vou lhe explicar ... preste muita atenção...
O sábio ancião de barbas brancas respirou profundamente e começou a explicar
— Olhe o mundo à sua volta. Esse é o Universo. Mas o que podemos ver e sentir é apenas uma pequena parcela do que existe. O Universo verdadeiro, ou total, nós chamamos de Atsiluth. O que você vê é o chamado de Plano Físico ou Mundo Material. Ou continuum espaço-temporal, como os cientistas chamariam. Mas nós cabalistas preferimos chamá-lo de Asiah. Você o sente porque o seu corpo faz parte do Asiah.
— Meu corpo ?
— Sim, nós o chamamos de Nefesh. Mas isso não é apenas o corpo físico, pois o Nefesh também inclui o corpo astral. Mas do mesmo modo que os seres humanos não são apenas o corpo, o Universo não é apenas o Plano Físico. Além do Asiah, em outro plano de vibração existe o Yetsirah...
— Isto eu já entendi: o Yetsirah é o Plano Anímico, que é sede dos Elementais.
— Muito bem, jovem. Mas o Yetsirah também é o Plano a que pertence a Alma, que nós cabalistas chamamos de Ruach.
— Ruach... e Briah ?
— Bem, além desses Planos existe um mais elevado, Briah. Poderíamos chamá-lo de Plano Angélico ou Espiritual. O Espírito ou Neshamah situa-se nesse plano. Eu sei, você deve estar pensando por que tantos nomes complicados. Isso é a Cabala, Boaz !
— E além de Briah, mestre ?
— Calma, Boaz, vamos com muita calma. Em Briah existem três regiões bem distintas. Uma, Shamaim, são os Céus, o Lar dos Anjos do Senhor. Outra, Sheol, o Inferno, a sombria morada dos Anjos Caídos.

— Os Caídos ?
— Sim, jovem, os Caídos. Mas deixe-me terminar. Há uma terceira região, o Dedangim, onde as Grandes Feras estão cativas. Além deles existe o Aravoth, que os cristãos chamam Empyreus, ou Décimo Céu. É lá que está o Deus Altíssimo, assistido pelo Príncipe Arcanjo Mitatrom. Mesmos os outros Príncipes Arcanjos só podem ir a Aravoth raramente. Como você pode ver, Boaz, A Criação é realmente muito mais do que podemos perceber. Satisfeito ?
— Sim, mestre, quer dizer ... quase !
O incrível interesse do jovem não parava de empolgar o professor. Realmente era um aluno muito promissor.
— Quase ? O que mais deseja saber ? Pode perguntar ?
— Quem são os Nefilim ?
O mestre subitamente emudeceu. Seu semblante mudou drasticamente. Uma visível irritação e nervosismo tomaram conta do ancião.
— Por que essa pergunta ?
Tentando disfarçar o sobressalto, o mestre solta uma resposta curta e seca.
— Os Nefilim eram filhos dos Anjos Caídos de que já falei. Isso foi antes do Dilúvio. Mas eles não existem mais ! Não existem .

— Desculpe. Estou enchendo a sua paciência. Me desculpe.

— Não se preocupe, Boaz, eu não estou irritado. Apenas acho que você não deve se preocupar com assuntos sem importância. Cuide apenas do essencial...

E o professor se afastou, sumindo entre as árvores do jardim.

Boaz começou o caminho de volta a seu quarto, caminhando lentamente, arrastando os pés por entre os jardins. Então, por trás dos arbustos de flores vermelhas, uma voz o chamou.

— Você deseja saber sobre os Nefilim, garoto ?
— É...quem é você? De onde você surgiu ? O professor já me disse o que eu queria.
— Ah, seu mestre ... Você realmente acha que o velho sabe tudo ?
— Quem é você?
— E se eu lhe dissesse que os Nefilim ainda existem ?
— Você acha que eu acreditaria em você ?
O desconhecido deixou escapar um largo sorriso de ironia. Fechou os olhos.
- Acho.
E o desconhecido abriu seus olhos, que se tornaram como dois archotes flamejantes.
— Preste atenção na minha estória...
Depois deste dia o jovem Boaz nunca mais foi visto. Seus antigos mestres jamais entenderão o porquê de sua desistência.







MESTRES E APRENDIZES foi escrito por Simões Lopes.

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